Há uma intimidade enigmática nas raparigas — as gémeas — que estão no centro de O Meu Pijama (2017), de Maria Inês Gonçalves, que sentimos quase de imediato, mal entram no enquadramento. Entram na piscina da família, cujas águas azuis escurecem com a chegada do crepúsculo, e mergulham a cabeça uma da outra — mas quem é quem? O cabelo comprido e as silhuetas delgadas tornam-nas quase indistinguíveis, e quando saem da piscina para se pentearem diante do espelho da casa de banho, é impossível não recordar momentos semelhantes de duplicação frente ao espelho — talvez o mais célebre seja a cena inquietante e vagamente erótica de Persona, de Ingmar Bergman, em que Bibi Andersson e Liv Ullmann parecem fundir-se uma na outra. Em contraste, as raparigas de Gonçalves, Helena e Sara, riem e parecem deleitar-se na sua semelhança. Quando uma pergunta à outra se consideraria contar um segredo — à mãe, talvez —, a resposta revela um desejo de preservar a sua unidade: “Preferia que fosses só tu a saber.”
O Meu Pijama foi realizado quando Maria Inês Gonçalves ainda era estudante de cinema (frequentou a Escola Superior de Teatro e Cinema, em Lisboa, e a Elías Querejeta Zine Eskola, em San Sebastián). No entanto, mesmo nesta fase inicial, revelou um interesse duradouro pelas texturas inquietantes da infância, demonstrando uma rara aptidão para trabalhar com atores infantis — uma aptidão que tira partido da sua natureza fundamentalmente indecifrável para criar narrativas elegantes e elusivas. Afinal, como podemos compreender os mais novos — como ousar defini-los — se eles próprios ainda estão a descobrir quem querem ser? Em O Meu Pijama, é a entrada do babysitter, um rapaz adolescente agradavelmente tranquilo chamado Vicente, que desencadeia essa exploração — ou melhor, essa separação, à medida que cada uma das gémeas se torna, diante dos nossos olhos, cada vez mais única. Esse processo é assinalado por um gesto curiosamente simples: Vicente tem dificuldade em distingui-las, por isso, a mais aventureira das duas troca o pijama roxo, igual ao da irmã, por um azul.
O filme seguinte de Gonçalves, a curta-metragem experimental O Banho (2022), explora o ritual infantil do banho através de uma cadeia fluida de associações que colapsam o espaço e o tempo. A câmara mergulha o espectador nas águas do banho de um bebé e volta à superfície com imagens de crianças mais velhas a correr por entre regadores automáticos. Lençóis brancos estendidos a secar no relvado transformam-se nas enormes velas de um barco que desliza sobre as águas remotas de um lago; mais tarde, essa embarcação reaparece sob a forma de um pequeno barco de brincar. Estas transições engenhosas, complementadas pelos sons vívidos da água a agitar-se, e por uma banda sonora minimalista e traquina, conferem às práticas mais banais um sentido quase inquietante de maravilha. Recordemos a sequência da tábua ouija em O Meu Pijama, que reforça ainda mais a inclinação mística de Gonçalves. Em O Banho, a água é uma força encantada; as suas ondulações e reflexos de luz são acentuados para criar abstrações visuais arcanas que intensificam a dimensão fantástica do filme. Peluches permanecem suspensos debaixo de água, como tesouros perdidos de outro reino.
Se O Banho dignifica a infância ao manifestar as suas possibilidades imaginativas, a obra mais recente de Gonçalves, La Durmiente (2025), encena uma forma inversa de magia ao trazer para terra a história da infanta portuguesa, Beatriz. O filme, um dos vencedores da competição de curtas-metragens do Festival Internacional de Cinema de Roterdão deste ano, retrata a disputa da jovem Beatriz, de 10 anos, pelo trono português após a morte do seu pai, o rei D. Fernando I. Gonçalves encena este feroz impasse político com um elenco composto quase inteiramente por crianças, vestidas com trajes medievais e a declamar as suas falas com uma simplicidade ingénua. Este drama de época, lúdico e deliberadamente artificial, faz lembrar uma peça de escola — uma teatralidade assumida quando uma das personagens quebra a quarta parede. No entanto, Gonçalves consegue extrair o divino do amadorismo ao intercalar as ternas interações das crianças com planos errantes de murais decadentes de catedrais, efígies de mármore, grutas sombrias e troncos de árvores gigantescos. Aqui, a realizadora funde o monumental com o minúsculo; o majestoso com o improvisado; o épico com o ingénuo — atravessando assim a história de Portugal e embalsamando a memória de Beatriz, cuja herança foi largamente esquecida, com o toque intemporal do mito. “Tenho de parar,” diz Beatriz em narração, ao refletir sobre as intrigas e batalhas em torno da herança que lhe foi negada, “senão a minha cabeça explode.” Esta Bela Adormecida não desperta com o beijo de um príncipe; em vez disso, é uma criança que dorme através de anos de tumulto que não consegue compreender.
Beatrice Loayza
Beatrice Loayza é crítica e historiadora, e vive em Brooklyn. É colaboradora regular do New York Times e o seu trabalho pode ser encontrado na Criterion Collection, Film Comment, Atlantic, Nation, New York Review of Books, 4Columns, entre outros. É também professora no departamento de cinema da School of Visual Arts e está atualmente a trabalhar num livro sobre as atrizes da Nova Vaga francesa.
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