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Looking for Langston

miguel bonneville
26 de Fevereiro de 2025

estou perante as portas da alucinação, também eu à procura de langston. porque é impossível ficar de fora—ver que o procuram implica procurá-lo também. implica ser cúmplice.

procuramo-lo nas suas reverberações, na origem, na existência e no legado, em todos os seus múltiplos formatos. e encontramo-lo. utopicamente, encontramo-lo – o que nos ajuda a imaginar uma espécie de plenitude, de mundo elevado quase perfeito.

o filme abre com uma citação de toni morrison, retirada da homenagem que prestou a james baldwin na sua cerimónia fúnebre, nos anos 80. ela cita-o: “uma pessoa não escolhe levianamente opor-se à sua sociedade. é preferível sentir-se em casa entre os seus compatriotas do que ser ridicularizado e detestado por eles.” abre com esta frase que diz tudo—se for possível aceitar que uma frase pode dizer tudo—, especialmente no que diz respeito à dificuldade e ao custo emocional de quem se posiciona contra os valores, normas ou crenças que predominam numa sociedade. diz tudo no sentido de explicar que desafiar o consenso social não é uma escolha fácil—implica isolamento, rejeição e hostilidade: o preço da dissidência. diz tudo no sentido de explicar que o desejo de pertencer faz com que se evite tornar-se alvo de desprezo, preferindo, por isso, a conformidade, o alinhamento ao grande grupo—mesmo que o preço a pagar seja abrir mão das grandes manifestações: a verdade, a liberdade.

o filme justapõe homenagens. funde-as. ou melhor, revela uma justaposição que já existia. revela as causas e os efeitos. move-se, em todas as direcções, de história em história, de legado em legado.

no entanto, acontece que, tal como quando se lêem muitos romances, quando se vêem muitos filmes, é possível acabar-se desgastado pelas histórias. abrem-se então outras possibilidades: fazer filmes que não procuram contar histórias, ou que estão para além das histórias que querem contar, ver filmes que não procuram contar histórias, não procurar histórias nos filmes que vamos ver. podemos, por exemplo, tentar parar de falar em histórias e começar a falar em imagens. de que forma podemos responder a uma história, ou refazer uma história, sem repetirmos a sua fórmula habitual?

looking for langston não parece ter muito interesse em obedecer às leis de um tipo de cinema que se foi cristalizando—e que se tornou, tiranicamente, o que é considerado cinema por excelência—, nem às leis das massas, ou às leis da literalidade. esta desobediência é um princípio, uma resposta, uma forma de revolução

a possibilidade de ser livre—como espectador, como realizador—, livre da ansiedade da razão, da compreensão, da linearidade. livre do medo. livre para se viver uma beleza isenta de violência—apesar de isaac julien jogar com essa possibilidade—de violência—, furta-nos dela, oferecendo-nos outros futuros, outros caminhos. já não estamos presentes quando ela chega. o que faz com que ela exista em vão, de si para si, caindo no vazio. e assim tornamo-nos inatingíveis, pertencemos a outra dimensão—do sonho, da alucinação, do amor, do desejo, da liberdade, da irmandade também.

langston, julien, baldwin, morrison, hemphill, nugent (entre, claro, muitos outros) oferecem-nos a recusa—a recusa de fazer parte de um sistema opressivo. e julien, mostrando-os unidos, faz com que a liberdade não só seja deslumbrante, mas pareça fácil—e faz sentir que talvez o seja. ou possa sê-lo. ou possa vir a sê-lo.

talvez só possamos encontrar langston—e todos os seus amigos—através do prazer, e da aceitação do prazer como forma de conhecimento (indo ao encontro do pensamento de roberta smith—partilhado, muito certeiramente, por uma amiga).

aqueles que estão sob o poder de alguém ou de alguma coisa têm esse conhecimento, e por isso estão sempre para além dos que detêm o poder—dançam, bebem, tocam, beijam, riem, exercem a liberdade com os próprios corpos—, sabem que qualquer solução institucional, constitucional, é um passo, mas nunca uma verdadeira solução, nunca uma verdadeira liberdade.

“humor é rir daquilo que não se tem quando se deveria ter”, disse langston. o humor como ruptura, então. como forma de resistência e sobrevivência diante da adversidade.

como resposta à tragédia, à falta—de direitos, de oportunidades, de reconhecimento. rir como forma de expor a fragilidade da ordem e da hierarquia. riso que surge da consciência de uma privação—sempre injusta.

rir do que falta é uma forma de expor o absurdo, de desarmar a dor, de transformar o sofrimento. é uma forma de alívio, sim, mas também de subversão e de crítica. uma denúncia, um mecanismo de sobrevivência, uma maneira de afirmar a própria humanidade, mesmo perante o roubo.

procurar langston é procurar (e encontrar) esse riso que expõe, abre e transforma. é viver—e viver, de facto—46 minutos que, simultaneamente, nos oferecem retratos fantasmagóricos da opressão e nos tiram do desespero político. e essa retirada é uma celebração.

miguel bonneville
miguel bonneville introduz-nos a histórias autoficcionais, centradas na desconstrução e reconstrução da identidade, através de obras que cruzam múltiplas áreas artísticas. Realizou filmes como Traça (2016), Um medo com duas grandes faces (2022), e Camera obscura (2023). Publicou os livros Ensaios de santidade (Sr. Teste, 2021), O pessoal é político (Douda Correria, 2021), e ainda as edições de artista Jérôme, Olivier et moi (Homesession, 2008), Notas de um primata suicida (2017), e, através do Teatro do Silêncio, Dissecação de um cisne (2018), Lamento do ciborgue (2021), Recuperar o corpo (2021) e Câmara escura (2022).

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